Porpaganda enganosa: Feirão do Nome Limpo leva milhares de pessoas para negociar dívidas
Propostas não agradaram ao consumidor em Centro de Convenções
O extrato da Serasa em mãos aponta: são seis dívidas que, hoje, ultrapassam R$ 2,5 mil. Começou com a compra do mês no mercado, depois vieram os gastos com roupa e sapato para a família, empréstimos, e, assim, as prestações foram acumulando. Com o marido desempregado, as coisas pioraram e o nome da cabeleireira Joana da Paixão foi parar no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). "Não tive saída. Virou uma bola de neve. Comecei a ajudar mais nas despesas de casa e tive que abrir mão de pagar algumas contas", contou.
Histórias como a de Joana se repetiam na fila que lotou o Centro de Convenções, ontem, no primeiro dia do Feirão do Nome Limpo, realizado pela CDL, FCDL e Serasa Experian. Eram pessoas que foram ao local na esperança de conseguir bons acordos para quitar as dívidas e garantir não só o nome limpo, mas também noites tranquilas de sono.
"Todo dia quando vou dormir e penso nessas minhas dívidas. É um tormento.
Sempre fui uma pessoa direita e o que eu mais quero é poder pagar logo essas contas", desabafou a doméstica Evanice Costa. Os débitos, segundo ela, não são altos. "Me enrolei com bobagem, prestação de R$ 50, R$ 60. O que pega são os juros, meu filho. A gente deixa de pagar um mês e quando vê já está o dobro no mês seguinte". Evanice acumula dívidas, principalmente, de cartões de loja. "Usei para comprar roupas para meus filhos no São João, Natal, só isso. Uma vez ou outra eu pegava um empréstimo para ajudar nas despesas de casa", disse.
O casal Ana Oliveira e Tiago Silva chegou na fila uma hora antes do portão abrir. Há quatro anos com o nome sujo, Ana não fazia nem ideia do quanto estava devendo. "Perdi as contas, acho que deve estar mais de R$ 1 mil", confessou. Ela disse que os débitos são do cartão de crédito da Marisa e Esplanada.
Quando questionada por que não pagou, a jovem desconversa: "Tinha outras prioridades. Acabei deixando de lado". Mas agora, a vontade é outra: "Dependendo do acordo, vou quitar logo. A esperança é sair daqui com o nome limpo". E desempregada, a conta vai acabar sobrando para o maridão. "Vou ter que pagar. Herdei ela e as dívidas, quando começamos a namorar", brincou.
Movimento
O volume de pessoas que procurou o Feirão do Nome Limpo, ontem, surpreendeu os organizadores do evento. O superintendente da CDL, Carlos Roberto Oliveira, estima que, só no primeiro dia, cerca de 10 mil pessoas passaram pelo Centro de Convenções.
O presidente da Serasa Experian, Ricardo Loureiro, disse que a movimentação era um bom sinal. "Isso é maravilhoso. É uma prova de maturidade. Mostra que o brasileiro é bom pagador". Segundo ele, Salvador foi a primeira capital a receber um evento deste tipo. "Mas essa é uma ideia que veio para ficar e vamos replicar isso em outros estados", afirmou.
Atualmente a Bahia possui cerca de 580 mil endividados. O cartão de crédito responde pela maior porcentagem das dívidas: 38%. Em seguida, vem o cheque especial (32%) e o crediário (17%).
Loureiro explica que este cenário advém do atual momento da economia brasileira, no qual a classe C alcançou uma melhora de renda significativa, o que possibilitou o consumo de produtos a que antes ela não tinha acesso. Algumas dessas pessoas, entretanto, perderam o controle e acabaram entrando para a lista do SPC.
Ainda de acordo com Loureiro, o mercado precisa, agora, criar mecanismos que impeçam esse tipo de consumidor de se endividar. "É preciso trabalhar para que se tenha uma melhor educação financeira. A palavra de ordem agora é a sustentabilidade, também no crédito".
Consumidores ficaram insatisfeitos
Depois de esperar horas na fila, muita gente que buscou atendimento no Feirão do Nome Limpo não saiu satisfeita. A autônoma Sandra Castro é uma delas.
Ao chegar lá, Sandra descobriu que das seis dívidas que possui, apenas uma poderia ser negociada: a do Gbarbosa, que, atualmente, está em
R$ 758. Depois de conversar com a atendente, ela disse que a proposta da empresa não agradou.
"Disseram para eu dar uma entrada de R$ 145 e mais seis prestações de R$ 97,23. O valor é quase igual ao da minha dívida. Cadê o desconto de 100% nos juros que eles disseram que iam dar? Isso aqui é uma enganação", criticou.
Além disso, agendaram um novo atendimento com Sandra, no dia 29, no supermercado, para solucionar o problema. "Eu deixei de abrir minha barraca para vir aqui achando que ia resolver meu problema e vou sair sem solução. Estou aqui perdendo tempo e dinheiro à toa. Isso aqui não é o mutirão do nome limpo, é o mentirão do nome limpo", bradou.
Insatisfação também foi o sentimento da operadora de telemarketing Carla Araújo, que teve que recorrer à central telefônica do IBI para negociar. "Eu poderia ter feito tudo de casa. Se eu soubesse que era para vir aqui e ter que ligar para a central, não tinha vindo".
A cozinheira Ana Andreza Conceição e o marido Robson de Souza também ficaram sem um acordo para sua dívida de R$ 70 mil com a Coelba. "Não localizaram o débito e disseram que eu tenho que ir num posto", contou o rapaz.
O mecânico Adailton Silva, a doméstica Rosenilda Pontes, e o autônomo Raimundo Mota também não tiveram motivos para comemorar. Os três voltaram para casa sem uma negociação que coubesse no orçamento e reclamaram da falta de flexibilidade das empresas. "Tenho uma dívida de R$ 800 e o IBI queria que eu desse uma entrada de R$ 330 agora. Eu pedi para pagar no dia 10 e eles não aceitaram. Disseram que assim o parcelamento ia aumentar de cinco para oito vezes", reclamou Rosenilda.
Adailton também lamentou. "Não tá fácil. Tudo desorganizado e nada do que eles prometeram está sendo cumprido. Queria pagar, mas não tá dando. Vai dar tumulto isso aqui".
Ciente das insatisfações, o superintendente da CDL, Carlos Roberto Oliveira, se comprometeu a dialogar com as empresas para oferecerem vantagens reais a fim de que os consumidores possam reabilitar o crédito. No caso do GBarbosa, o gerente de cobrança, Michel Albuquerque, falou que os descontos são concedidos de acordo com uma tabela de cálculo do tempo da dívida.Eles variam de 20% a 65% para quem paga à vista e de 10% a 45% para o parcelado.
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