Reforma trabalhista não afeta garantias dos professores



por Juvêncio Marins, Juiz Federal do Trabalho, Jornalista, Professor e Escritor


Com o retorno às aulas, as principais preocupações dos professores estão concentradas no alcance da Reforma Trabalhista  (Lei 13.467/17nos seus direitos.

Pontos que tiram o sono de muitos professores, tais como: 1) demissão e homologação (por iniciativa do empregador ou pedido de demissão); 2)mudança de carga horária para 2018; 3) recesso e 4) garantias sindicais (estabilidade provisória)

Quero tranquilizar os professores, pois, todos esses assuntos estão regulamentados nas Convenções Coletivas de Trabalho e não são afetadas pela reforma trabalhista.

As condições estabelecidas nos contratos de trabalho celebrados antes de 11 de novembro de 2017 perderão a sua validade quando a lei entrar em vigor?

Não. Todas permanecerão intactas, por se encontrarem garantidas pelo Art. 5º, inciso XXXVI, da CF, que estabelece: “A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”; bem assim, pelos Arts. 9º — mantido sem alteração — e 468 — com caput mantido sem alteração — da CLT.

Assim sendo, qualquer tentativa de se promover alteração contratual, mesmo na rescisão, em prejuízo dos trabalhadores, será considerada nula de pleno direito.

As empresas poderão reduzir ou suprimir direitos assegurados em convenções coletivas por meio dos chamados acordos individuais?

Não. Primeiro, por força dos já citados Arts. 9º e 468 da CLT. Segundo, porque, por determinação constitucional (Art. 7º, caput e inciso XXVI, da CF), pela jurisprudência do STF (REs 590415 e 895759) e pela própria lei ( Art. 611-A), as condições estabelecidas coletivamente prevalecem sobre as individuais, exceto quando estas forem mais vantajosas.

Isto quer dizer que se a convenção coletiva estabelecer que as férias têm duração de 30 dias ininterruptos, a empresa não pode parcelá-las?

Sim. Em casos que tais, em nenhuma hipótese poderá haver parcelamento.

A mesma regra vale para o banco de horas?

Vale, sim.

E  se a  concessão das férias não estiver regulamentada em instrumento normativo (acordo coletivo e convenção coletiva), o empregado é obrigado a aceitar o seu parcelamento?

Legalmente, não. O Art. 134 da CLT exige expressa concordância do empregado para que isto ocorra. Porém, em razão do poder absoluto que a empresa possui de admitir e demitir sem óbice legal, dificilmente o empregado terá essa opção.

E se, não havendo regulamentação em instrumento normativo, as férias forem parceladas em três períodos, sendo um de 14 dias, e os outros dois de oito cada um, como se dará o seu pagamento, antes ou depois do seu suposto gozo? E o terço assegurado pelo Art. 7º, inciso XVII, da CF?

Primeiro, faz-se necessário esclarecer que, por força do que dispõe o Art. 134, § 3º, da CLT — com a nova redação —, nenhum dos três períodos de férias poderá iniciar-se “no período de dois dias que antecede feriado ou de repouso semanal remunerado”.

Segundo, o Art. 145 da CLT, que determina o pagamento antecipado das férias, devidamente acrescidas de um terço, não sofreu alteração. Assim, em caso de parcelamento das férias, cada período terá de ser pago, com o acréscimo de um terço, com a antecedência de dois dias de seu início, sob pena de não ser considerado como tal, em conformidade com a Súmula N. 450, que não sofreu nenhum arranhão.

O FGTS sofreu alguma alteração?

O Art. 611-B da CLT veda a possibilidade de redução e/ou supressão de 30 direitos, dentre os quais se encontra o FGTS (inciso III). No entanto, de forma oblíqua, haverá alteração em prejuízo do empregado, sobretudo as que decorrem das modificações promovidas no Art. 457, que excluem diversas verbas da composição dos salários e, por conseguinte, do cálculo do FGTS.

E a licença-maternidade corre algum risco de ser suprimida e/ou reduzida?

Pela Lei N. 13.467/2017, não. Esse direito inclui-se no rol dos que não podem ser objeto de redução e/ou supressão, elencados pelo Art. 611-B.

A Lei traz nova possibilidade de concessão de licença-maternidade, no Art. 394-A, § 3º, quando a empresa não tiver condições de designar atividades às empregadas gestantes ou lactantes, afastadas de atividades insalubres, “a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, nos termos da Lei  nº 8213, de 24 de julho de 1991, durante todo o período de afastamento”.

O empregado poderá se recusar a assinar o termo de rescisão de contrato de trabalho na empresa e exigir que este seja homologado pelo seu sindicato?

Isto somente será possível se a convenção e/ou acordo coletivo fizer esta exigência. Caso contrário, não. Não havendo determinação em instrumento coletivo de trabalho, o empregado terá de assiná-lo na própria empresa, devendo, contudo, consultar previamente o sindicato sobre o que pode ser assinado e o que não pode, notadamente se estiver doente — com ou sem licença médica —, ou portador de estabilidade, qualquer que seja a sua natureza, hipóteses que vedam a sua demissão. A sugestão é assinar com ressalvas de direitos.


Pela nova lei, a partir do momento em que o empregado assinar a rescisão de contrato, não terá mais o direito de ingressar na Justiça do Trabalho, reclamando o que não recebeu?

Trata-se de matéria controvertida, que, por certo, suscitará muita discussão judicial. Se a rescisão de contrato de trabalho for assinada na empresa, ou homologada pelo sindicato competente, a quitação limita-se aos valores constantes do TRCT.

Se for homologada pela Justiça do Trabalho, igualmente, desde que o empregado não aceite constar da petição de ‘acordo’ e/ou da sentença homologatória, que fica extinto o contrato de trabalho, hipótese em que nada mais poderá ser reclamado. Recomendo a mesma sugestão da pergunta anterior: ressalva de direitos.

Como a reforma trabalhista impactará no regime de contratação docente, diante das possibilidades que ela abre para professores em geral, mas especialmente para os universitários e de cursos livres, dos quais muitos se enquadram como os impropriamente chamados de hipersuficientes?

Como prejudicial de mérito, que afasta, em definitivo, tais dispositivos encontram barreiras intransponíveis no princípio da isonomia (insculpido no Art. 5º, caput); na proibição de normas que afastem da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direitos (Art. 5º, inciso XXXV); no reconhecimento das convenções e acordos coletivos, como direito inafastável dos integrantes da categoria, em âmbito geral, quanto àquelas, e da empresa, no tocante a estes (Art. 7º, caput e inciso XXVI, da CF); e na função social do contrato (Art. 421 do Código Civil).

Ainda que a Justiça do Trabalho venha a fazer tábula rasa dessas barreiras, o que não é razoável nem se espera, sobressai a impossibilidade da comentada aplicação, por força do que preceitua o Art. 320, da CLT, caput e § 1º, combinado com o 7º da Lei N. 605/1949, e na Súmula N. 351 do TST, que determina a forma de cálculo da remuneração de professores, com base na carga horária semanal, multiplicada por 4,5 semanas, acrescidas, cada uma delas, de 1/6, a título de repouso semanal remunerado, e, o resultado, pelo salário-aula, sendo que esta pode ser variável, consoante a Orientação Jurisprudencial (OJ) N. 244, também do TST.

Não havendo garantia de estabilidade da carga horária, com frequência, ocorrerá de a remuneração ficar abaixo do valor fixado pelo Art. 444, parágrafo único, da CLT, que equivale a duas vezes o teto do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), atualmente fixado em R$ 5.531,31, o que, de plano, tornará nulo eventual acordo de inaplicabilidade dos instrumentos coletivos e de cláusula compromissória, por força da função social do contrato, ditada pelo Art. 421 do CC, e dos princípios da probidade e da boa-fé, na celebração e na execução do contrato, conforme preconiza o Art. 422, igualmente do CC.

Reforça essa tese a cláusula da imprevisão, consagrada no Art. 478 do CC, que assim reza: “Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação”.

Destarte, por qualquer ângulo que se analisar a questão posta para debate, é forçoso concluir pela inaplicabilidade do que estipulam os Arts. 444, parágrafo único, e 507-A, ambos da CLT.


Demissão por iniciativa do empregador

As escolas, IES, Faculdades e Universidades devem comunicar a demissão até o dia que antecede o início do recesso e o aviso prévio tem que ser obrigatoriamente indenizado. Os professores têm direito ao pagamento do recesso, além do aviso prévio e demais verbas rescisórias. Na educação básica, o professor recebe até 20 de janeiro e no ensino superior, até 18 de janeiro, assegurado um mínimo de 30 dias. A escola, IES, Faculdade ou Universidade que comunicar a demissão ao professor fora do prazo (até um dia antes do recesso) ou após o reinício das aulas, deverá arcar com a Garantia Semestral de Salários (art. 322, parágrafo 3° da CLT e Súmula 10 do TST). Se o professor fizer parte de sindicato ou associação da categoria, ainda que como suplente (Súmula 369 do TST), terá além da Garantia Semestral também direito à remuneração pelo período do mandato acrescido de mais um ano.


Pedido de demissão

Também está nas Convenções Coletivas: a demissão pode ser comunicada até um dia antes do recesso. A instituição de ensino não pode exigir o cumprimento do aviso prévio e os professores têm a garantia do recesso (na educação básica, recebem até 20 de janeiro e no ensino superior, até 18 de janeiro). É preciso trabalhar até o encerramento das atividades letivas.


Homologação da rescisão contratual

As rescisões contratual devem ser homologadas, de acordo com as Convenções Coletivas que preveem, inclusive, multa diária quando a homologação não for feita no prazo de vinte dias a contar da data de pagamento.
Também consta das Convenções que o prazo de pagamento das verbas rescisórias é de 10 dias corridos, quando o aviso prévio for indenizado, ou no dia seguinte ao encerramento do aviso prévio, quando trabalhado.


Recesso de 30 dias

Todos os professores têm direito ao recesso de pelo menos 30 dias durante os quais eles não podem ser chamados para nenhuma atividade.

Mudança na carga horária para 2018

A alteração de carga horária, seja por reestruturação curricular ou falta de alunos, também está regulamentada nas Convenções Coletivas de Trabalho.

Quando decorrente de modificações na grade curricular, a mudança deve ser avisada com antecedência, até o final do ano letivo anterior (no ensino superior, o prazo é de 30 dias). Os professores afetados têm prioridade na atribuição de aulas.
Caso o professor não aceite a mudança, a instituição de ensino deve manter sua carga horária ou desligá-lo por demissão sem justa causa. Se a demissão for comunicada depois do dia que antecede o recesso), é devida a Garantia Semestral de Salários, conforme explicado.

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